sábado, 13 de agosto de 2011

Caderno de Poesia - Unaí, 1º de Abril de 1996 - V



Há quem cultive amor na solidão e quem acredite que felicidade só existe compartilhada
eu já dei boa noite pra televisão fiz serenata pra cachorrada e batizei cafeteira de 110 volts com nome de feminista existencialista
mas tive pena ao ver a costureira desamada de minha prima Juvena a noiva interiorana engravidada
o nome dela a costureira é Maria e a vida inteira fez vestidos de noiva enquanto em seu rosto o tempo cristalizava a infelicidade da solidão.
um dia me fiz Noiva por etnografia e procurei Maria meu estudo de caso
ela me mediu inteira: punho pescoço braço e bacurinha e me disse maquinal que eu faria muito feliz o noivo que não existia
voltei lá vezes mais e na quarta ou na terceira Maria me vestiu num emaranhado de tecido alvo anilado engomado e garboso 
nesse dia Maria me espetou um alfinete na prova me transmitindo seu vírus do sem-par
entendi na hora a infecção que tomava meu sangue e meu destino e louca de tédio ganhei a rua empacotada num vestido de noiva semi acabado sob um sol a pino que me deixava com consistência de assombração
desci sonâmbula para a boca da ponte onde pude ver aqueles rostos ribeirinhos que com meu rosto já teve alguma parecença que perdi na inexpressividade da cidade grande no cientificismo e no excesso de maquiagem
certa de que só seria e que sendo só jamais encontraria grandes pazes tomei o acesso pro rio me entreguei às águas me abracei à morte tal e qual à personagem a quem sempre questionei a força da feminilidade
Já agora não sinto medo de ser só
porque só agora não sinto porque só agora não sou

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